18 de dezembro de 2010

Para ambientalistas, mudanças no Código Florestal é verdadeiro 'tiro no pé'

São Paulo – As alterações ao Código Florestal propostas no Congresso Nacional podem colocar em risco os avanços contra o desmatamento conquistados nos últimos anos, na avaliação de técnicos do Ministério do Meio Ambiente e de ONGs ambientalistas. As mudanças defendidas pelos representantes do agronegócio vão na contramão de fatores que levaram o Brasil ao menor nível de derrubada na Amazônia Legal em 23 anos.
“(A mudança no Código Florestal) é um tiro no pé porque vai criar condições para voltar a crescer o desmatamento", analisa Adalberto Veríssimo, pesquisador sênior do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). "Ao anistiar infratores ambientais, convida para que voltem a infringir a lei porque a leitura é de que em algum momento o governo vai anistiar novamente”, explica.
A pressa e a força da bancada ruralista não deixam dúvidas quanto às reais possibilidades de aprovação do texto do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), relator da comissão especial que trata da matéria. Embora não tenham conseguido passar o texto pelo plenário da Câmara logo após as eleições, descumprindo acordo prévio firmado com o então presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), os parlamentares esperam garantir tramitação de urgência no início do próximo ano legislativo.
Para isso, contam com o apoio do ministro da Agricultura, Wagner Rossi, confirmado por Dilma Rousseff para ocupar o cargo. Rossi considera que o projeto de Rebelo é “nota 10” e rebate as críticas de que haverá aumento do desmatamento, apontando, em contrapartida, que os produtores terão mais segurança jurídica.
Não é esta a visão do Ministério do Meio Ambiente, de organizações não-governamentais e de pesquisadores do setor. O texto reduz áreas de preservação, permite plantio em encostas, deixa a cargo do produtor a maneira como fará a recomposição da mata derrubada e perdoa todos os desmates feitos até julho de 2008, entre outras concessões.
Na oposição à pasta da Agricultura, inclui-se ainda a do Desenvolvimento Agrário. O argumento dos produtores rurais, encampado por Rebelo, é de que a atual legislação ambiental é um empecilho ao desenvolvimento econômico. Tal posição não é vista com bons olhos pelos defensores da preservação.
“Não podemos traçar uma incompatibilidade entre desenvolvimento e meio ambiente. É necessário que o país proteja o meio ambiente e também o desenvolvimento da agricultura e da indústria, que é a proteção do emprego”, afirmou o deputado do Pcdo B ao portal Sul21.
O Ministério do Meio Ambiente gostaria de apresentar uma proposta alternativa, com menos concessões aos ruralistas e mais garantias de preservação. “É importante ressaltar que muita gente, na Amazônia e no Brasil todo, faz sua parte. E agora não dá para chegar e falar que quem cumpriu foi bobo”, avalia Mauro Pires, diretor do Departamento de Combate e Controle do Desmatamento do ministério.
"É um recado claro de que o desmate vale a pena, de que o crime compensa", ironiza Rafael Cruz, integrante da campanha de Amazônia do Greenpeace. Para ele, o grupo de influência em Brasília usa a produção de alimentos como justificativa para mudar a lei, embora considere que a alegação não seja verdadeira. Nos cálculos da organização, uma das mudanças propostas pelo deputado, a de reduzir a preservação da mata ciliar, seria suficiente para, sozinha, minar todos os esforços feitos pelo Brasil nos últimos anos.
O potencial de desmatamento de 640 mil hectares provocado por esta alteração seria superior ao desmatamento que o Brasil espera ter em 2020, quando se esgota o prazo assumido perante todo o mundo de redução de emissões de gases-estufa. No ritmo atual, de forte tendência de queda da derrubada da Amazônia, o Ministério do Meio Ambiente planeja cumprir com alguma folga a meta firmada durante a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-15), no fim de 2009 na Dinamarca.
Paulo Maurício Lima de Alencastro, pesquisador do Departamento de Ecologia do Instituto Nacional de Pesquisas de Amazônia (Inpa), vê com grande preocupação a movimentação no Congresso. “Já começamos a reduzir as áreas de preservação permanente, a alterar a lei para que legalize as pessoas que não estão adequadas às normas, tudo isso são erros. Não se pode alterar. A sociedade não deveria permitir esse tipo de coisa.”
A Via Campesina pediu, em nota, que todos os brasileiros se mobilizem para derrubar o projeto, visto como um ataque a tudo que se oponha aos interesses privados. “Para o latifúndio do agronegócio, que se utiliza da monocultura, de quantidades gigantescas de agrotóxicos e de trabalho escravo, o Código Florestal é um empecilho, que deve ser destruído assim como as florestas da Amazônia, da Caatinga e do Cerrado”, defende a entidade.
O Código Florestal brasileiro é visto por ambientalistas como uma legislação extremamente avançada em termos de preservação, especialmente se tomado em conta o pioneirismo das medidas implementadas a partir das primeiras décadas do século 20 e consolidadas em 1965. Por isso, as modificações poderiam ter um caráter de incentivo ao desmatamento. “Se afrouxar (as exigências), é mais difícil de voltar a ganhar força porque o governo perde a moral. Esse é um embate em que está se testando a consistência e a persistência das políticas públicas”, pondera Veríssimo, do Imazon.

Fonte: http://www.redebrasilatual.com.br

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