23 de dezembro de 2010

A Amazônia em 2020

Em 2020, a Amazônia poderá continuar abrigando a mais extensa e conservada floresta tropical do mundo e manter o maior e mais diverso estuário do mundo. A biodiversidade poderá deixar de ser assunto apenas acadêmico e se tornará oportunidade de renda e emprego. A grande diversidade de espécies de árvores de valor madeireiro e não madeireiro poderá ser manejada com rigor ambiental e controle social. A rede hidrográfica de vasto potencial hidrelétrico (cerca de 60% do potencial nacional) e de transporte alavancará o desenvolvimento regional. E a região poderá começar ser recompensada pelos serviços ambientais prestados na regulação do clima.
Embora esse cenário pareça otimista, há chances de que possa ocorrer. Motivo: nunca a Amazônia foi tão estratégica como agora. De região problema nas três últimas décadas, a Amazônia poderá emergir até 2020 como uma região próspera, capaz de conciliar desenvolvimento, conservação e diversidade sociocultural. Isso decorre do papel central que a Floresta Amazônica terá para o Brasil em duas áreas essenciais para o país na próxima década: clima e energia.
É largamente reconhecido o papel da Floresta Amazônica na regulação regional e global do clima. Ela é, por exemplo, “provedora” de chuvas para amplas áreas do Sul e do Sudeste. Mas é na contribuição do Brasil para a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) que ela será estratégica. Da meta de redução de pelo menos 36% em relação à tendência esperada (inercial) até 2020, pelo menos três quartos serão cumpridos pela Amazônia, tanto pela redução do desmatamento como pela geração de energia por hidrelétricas e pela reforma da produção agropecuária. Enfrentar o desmatamento da Amazônia é crucial para o Brasil reduzir seu passivo de emissões.
Na área de energia, o Brasil dependerá fortemente da floresta para gerar a energia hidrelétrica necessária ao desenvolvimento da próxima década. São as florestas, com suas chuvas e rios caudalosos associados, que possibilitam a produção hidrelétrica. Assistiremos a planos de forte expansão da rede de usinas na Amazônia. Essa expansão gerará riscos graves se forem repetidos os erros do passado, quando as hidrelétricas catalisaram ocupação desordenada, conflitos sociais e desmatamento. Mas é possível que essas iniciativas representem também oportunidade, se pactuadas com os setores socioambientais e se a energia dinamizar a economia regional.
Até meados desta década, quando o PIB crescia, o desmatamento disparava. Foi preciso um plano vigoroso de combate ao desmatamento (lançado em 2004) para mudar essa correlação. Em 2010, a economia da Amazônia cresceu à taxa quase chinesa, enquanto o desmatamento despencou para a menor taxa da história, atingindo 6.400 quilômetros quadrados.
Em 2020, as perspectivas podem ser ainda mais promissoras. As apostas mais prováveis incluem o desmatamento próximo de zero (cenário otimista), passando por um cenário de desmatamento baixo (inferior a 1.000 quilômetros quadrados), até um desmatamento de cerca de 3.900 quilômetros quadrados, o que corresponde à meta de redução de desmatamento assumida pelo Brasil em 2009.
A economia da Amazônia tende a ser mais vigorosa e competitiva. A começar pela mineração, que deve manter a fase de boom atual, impulsionada pela forte demanda chinesa. Haverá forte pressão para a industrialização mineral na região, mas isso dependerá da oferta de energia e da melhoria da logística.
A imperiosidade de produzir sem desmatar provocará mudanças profundas na pecuária e no cultivo de grãos, levando à intensificação e ao consequente aumento de produtividade. Só os produtores com selo de qualidade e rastreabilidade se manterão no mercado extremamente exigente de 2020.
No caso das áreas desmatadas e abandonadas, haverá duas macrotendências. Primeiro, a maior parte dessas áreas será substituída por extensas áreas de reflorestamento, tanto para fins de restauração ambiental como de produção. Surgirão novas fábricas de MDF e plantas de papel e celulose. Segundo, parte dessas áreas se transformará em cultivos com o dendê, que poderá alcançar 1 milhão de hectares em 2020 (atualmente são pouco mais de 50.000 hectares).
Em torno da floresta nativa devem prosperar muitas das novidades da economia da Amazônia. Será possível gerar renda, emprego e tributos não apenas de madeira e produtos não madeireiros, mas também da biodiversidade. Mecanismos de pagamento de serviços ambientais deixarão de ser uma miragem para se tornar realidade. A combinação de oportunidades nas florestas nativas e plantadas tornará a Amazônia o principal polo de produção florestal do Brasil.
Apesar dos avanços, a Amazônia enfrentará ameaças e reveses. Iniciativas legislativas para flexibilizar a lei ambiental (incluindo anistias a crimes ambientais), bem como a redução das áreas protegidas, podem catalisar a volta do desmatamento. A demora em implementar uma estratégia para pequenos produtores pode ter o mesmo efeito. A lentidão na regularização fundiária pode comprometer a intensificação do uso da terra. Como contraponto, ONGs e movimentos sociais serão mais pragmáticos, propositivos e com capacidade de buscar soluções integradas, combinando mercado e políticas públicas.
A Amazônia precisa de investimento de grande porte para se tornar parte da solução e não mais problema nacional. Estima-se um total de R$ 200 bilhões de 2010 até 2020. Seriam R$ 20 bilhões anuais em áreas estratégicas, como ordenamento fundiário, ciência e tecnologia, assistência técnica, desenvolvimento de novas cadeias produtivas e melhoria substancial dos serviços públicos. Ao final desse período a economia da Amazônia estaria posicionada com base no conceito de “baixo carbono”. Em 2020, a Amazônia seria um exemplo de como conciliar natureza, economia e diversidade sociocultural.

Fonte: http://revistaepoca.globo.com

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